Normalmente, a nostalgia é uma mistura de saudade, alegria e melancolia. Mas para uma parcela das crianças que cresceram nos 70 e 80, sobretudo nos Estados Unidos (EUA), rememorar esse período pode ser cruelmente sangrento e infestado de pesadelos persistentes. Existe, inclusive, uma denominação para essa geração: os Stranger Danger (Perigo Estranho, em tradução livre).
O Telefone Preto chama todos aqueles que se lembram de temer uma van sem identificação, os vizinhos sussurrando, um bicho-papão aparecendo a qualquer momento para arrancar sua liberdade, família e vida. Um conto sombrio de um serial killer que tem como alvo crianças, o longa tem algumas ideias distorcidas e reviravoltas inteligentes. Mas isso nos choca como aqueles medos de muito tempo atrás?
Nos anos 70, houve o horrendo caso de crime real de John Wayne Gacy, o Palhaço Assassino. Nos anos 80, Stephen King criou sua própria versão com seu romance de terror sobrenatural, It. Agora, as crianças que cresceram à sombra dessas histórias estão fazendo seus próprios filmes de terror. O Telefone Preto reúne o trio de talentos de A Entidade — filme eleito o mais assustador de todos os tempos — : o diretor Scott Derrickson, o roteirista C. Robert Cargill e o protagonista Ethan Hawke. Juntos, eles dão vida a um conto original de Joe Hill, escritor e filho de ninguém menos que o lendário Stephen King.
Os atores Ethan Hawke e Mason Thames, fazem parte da história que apresenta o drama de um garoto de 13 anos, sequestrado por um assassino de crianças, The Grabber, que arrebata meninos adolescentes em plena luz do dia.
Nostálgico em suas cores e fotografias, Derrickson traz à tona um subúrbio dos anos 70 corrompido pelo horror de brigas, violência, bullying e da van preta que circula pelas ruas. Após ser sequestrado, Finney é mantido preso em um porão à prova de som.
Tudo que o garoto consegue ver é um telefone preto desconectado. No entanto, sua esperança está justamente neste fio que misteriosamente o conecta as vítimas anteriores do criminoso em uma missão de sobrevivência.
Determinadas a impedir que Finney tenha o mesmo fim que elas, as vítimas ajudarão ele e sua corajosa irmã, Gwen, que possui habilidades de clarividência, interpretada por Madeleine McGraw, a fugir de mais um cenário tenebroso. É justamente a história que caminha paralelamente ao sequestro que torna o filme singular.
Além do roteiro muito bem - embora tenha lá suas conveniências - costurado com a direção que proporcionam momentos chocantes e bastante assustadores, as atuações de Hawke e Mason merecem destaque. Com suas sinistras máscaras, olhares marcantes e jogadas corporais, que me lembram um pouco a ótima atuação de Joaquin Phoenix em "Coringa", Hawke consegue entregar muito além do que a violência desenfreada de seu personagem.
Com uma vilania imprevisível, Grabber demonstra um comportamento sugestivo a regressão de idade, visto em criminosos que passam por traumas na infância e são transpassados ao telespectador por nuances da atuação do ator.
Já Mason como Finney é um convite ao melhor do suspense. Todas as formas com que o ator demonstra suas intensas mudanças de emoções, que vão de medo a comédia juvenil, são o completo desenvolvimento de um personagem que o fará tremer.
Acima eu disse que as crianças da geração Stranger Danger estavam fazendo filmes, a resposta está na filmografia de Derrickson e Cargill. Em O Telefone Preto não temos o melhor filme da dupla, mas ele é, sem dúvidas, um presente cativante para uma nova geração de fãs de terror.
O Telefone Preto estreia nesta quinta-feira (21) nos cinemas brasileiros.
Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor de filmes valvulado. Jornalista do Norte que invadiu o Sudeste para fazer e escrever filmes.