Netflix aposta numa abordagem destoante da obra original de Jeff Lemire para agradar um público maior, mas nunca perdendo sua essência.
Após o fracasso de público e crítica do O Legado de Júpiter, a Netflix fez uma aposta ousada em lançar Sweet Tooth em um curto espaço de tempo entre uma adaptação de HQ para outra. O problema não é pela obra do renomado Jeff Lemire, mas sim pelo seu contexto: Sweet Tooth é um conto de fadas as aveses, com tom desesperançoso vivido em um mundo distópico devastado por um vírus mortal.
Convenhamos, assistir medo e isolamento de uma pandemia enquanto enfrentamos uma na vida real, não seria para todos. Foi aí que Netflix acertou em cheio, trazendo uma abordagem esperançosa para lidar com as consequências de tal evento. Traçando assim, um paralelo com boa parte do mundo – sobretudo os Estados Unidos – que vem vacinando sua população e vendo, aos poucos, a vida voltando ao normal.
Assim como a HQ publicada em 2009, a série retrata esse mundo pós-apocalíptico assolado pelo vírus conhecido como Flagelo. Essa doença misteriosa surgiu de forma simultânea aos híbridos, crianças que têm características físicas tanto humanas quanto animais. Com o decorrer dos anos, os sobreviventes do Flagelo passaram a viver em espécies de tribos, que vão desde pessoas que se aproximaram da natureza após o evento, até milícias armadas.
O protagonista do show, Gus (Christian Convery), é um garoto-cervo de dez anos que cresceu e passou a vida inteira escondido no centro de uma reserva em Nebraska com seu pai (Will Forte). Após uma sequência de eventos trágicos, Gus acaba deixando a propriedade e viajando com o misterioso Jepperd (Nonso Anozie) em busca de sua mãe.
Sweet Tooth começa devagar, dedicando mais tempo ao protagonista e no relacionamento dele com o pai, algo pouco explorado por Lemire na HQ. Com o decorrer dos episódios também somos apresentados a outras narrativas, como a do Dr. Aditya Singh (Adeel Akhtar) e Wendy (Naledi Murray), que passaram a ser mais importantes no final da temporada e provavelmente nas próximas temporadas. Além de apresentar personagens novos para o live-action, como a Aimee (Dania Ramirez) e Ursa (Stefania LaVie Owen).
Simplesmente diferente
Os fãs mais chiitas da HQ podem se incomodar com a mudança de tom, mas eles não podem reclamar da estrutura narrativa da série, que segue a mesma da obra original. As mudanças mais significativas estão nos personagens, sobretudo em Gus, que vai de um garoto assustado com o mundo além da cerca, para um garoto com uma inocência pura, incluindo em seu senso de esperança inexistente na HQ.
Essas mudanças de tom também são fortemente marcadas pela fotografia mais saturada e com pessoas “menos esquisitas”, como as propostas pelos traços de Lemire. O que lembra bastante o filme Onde Vivem os Monstros, de Spike Jonze, em que existe um certo equilíbrio entre a esquisitice daquele universo sem nunca perder o tom esperançoso de um bom conto de fadas.
Em meio a tantos pontos positivos, Sweet Tooth não está isento de problemas, o principal deles certamente é a falta de desenvolvimento do antagonista General Steven Abbot (Neil Sandilands). Falta motivação e sobra caricatura, o que fica mais destoante se compararmos com os demais personagens da história.
No frigir dos ovos Sweet Tooth é uma adaptação muito bem feita e que abrange o público-alvo da obra original. Vale lembrar que a HQ foi publicada pela Vertigo, selo adulto da DC. No live-action temos uma aventura mais universal e digerível para o público, que quer também superar um vírus moral na vida real.
Confira o Trailer abaixo
Resultado de uma experiência alquímica que envolvia gibis, discos e um projetor de filmes valvulado. Jornalista do Norte que invadiu o Sudeste para fazer e escrever filmes.